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Ler ou não ler..

Essa história de que o brasileiro não gosta de ler me dá quase tanta irritação quanto a máxima esfarrapada de que mulher não gosta de política. Se houver espaço, condição, incentivo e recurso, a imagem distorcida de nosso exercício de cidadania cultural e política não se sustenta meio minuto, num olhar da nação no espelho.


Quando o bom senso voltou a frequentar as decisões palacianas em Brasília, o estímulo à abertura de CACS que nos apavorou e oprimiu por 4 anos deu lugar a uma disposição nunca vista de aumentar o acesso aos livros. Em números absolutos, já estamos trilhando o caminho seguro das letras e da leitura, em detrimento ao nada edificante cenário do tiro, porrada e bomba que anabolizou boçalidades, pais afora. Esse 2023 termina com uma queda no registro de armas de fogo de quase 80%, segundo o Ministério da Justiça, e um aumento de mais de 4% no mercado editorial brasileiro. Um exemplo notável de que os investimentos em políticas de incentivo à leitura são uma bola dentro é nossa Feira do Livro e das Multivozes, no Pará. Na edição deste ano, o público de 450 mil pessoas movimentou, em 9 dias, 18 milhões de reais em venda de livros – mais de 700 mil livros. Esse não é um resultado singelo, acanhado. É, sem dúvida, um poderoso e oportuno manifesto em favor da cultura, do saber, da educação que emancipa e faz pensar. Sobretudo se esse resultado receber mais uma camada analítica: a da economia familiar. O visitante que decidiu investir tempo e dinheiro na experiência da prosa, da poesia ou do romance mora na 21a capital em renda per capta do país. O dinheiro é contado, não sobra e, em nossa Feira, as crianças representam um dos mais relevantes públicos consumidores deste extraordinário produto cultural que, a despeito de todas as previsões, não caiu de moda. Ver a alegria da meninada desfilando faceira com seu livrinho na mão é um dos maiores prazeres de quem trabalha nas editoras, livrarias, na organização, limpeza, segurança, na divulgação deste sublime encontro com a literatura.


Mas, para além do ato voluntário de comprar um livro, miremos nas estantes comunitárias que nos oferecem gratuita e generosamente a experiência de ler. Em 2024, 560 municípios ganharão mais de 187 mil unidades habitacionais do Minha Casa Minha Vida, num total de 1,2 mil empreendimentos. Em cada um deles haverá uma biblioteca. Numa só tacada, cerca de 750 mil brasileiros terão acesso a prateleiras coloridas e convidativas repletas de livros. É uma capital inteira como Natal chegando em casa com um livro na mão. E, cá entre nós, essa imagem é muito mais civilizada e auspiciosa do que um pai abrindo seu portaluvas do carro para sacar uma arma, no calor de uma discussão de trânsito.


Quando os fogos anunciarem o novo ano e você for pular as 7 ondas, depois de dar aquela colherada nas lentilhas, inclua em seus pedidos os caminhos abertos para um Brasil leitor. De brinde, você certamente receberá um país mais solidário, educado, sensível e comprometido com o bem comum.



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